terça-feira, 13 de julho de 2010

Data da recuperação

Conforme informei aos alunos que vieram receber o trabalho no último dia de aula, o prazo-limite para os trabalhos de recuperação é 15 de julho.
A data foi fixada levando em conta que terei de entregar as correções poucos dias depois.
Bom trabalho!

terça-feira, 29 de junho de 2010

Sobre os trabalhos

Sobre os trabalhos

Corrigi os trabalhos recebidos e eles serão entregues aos alunos, se tudo estiver normal hoje, esta noite. Depois disso, estarão ao dispor de vocês na secretaria.

Houve vários trabalhos muito bons, de modo que foi possível dar a nota máxima a alguns deles. Fico satisfeito com o resultado do curso, no que diz respeito à parte de vcs!

A correção foi "cega", isto é, li os trabalhos sem levar em conta quem era o aluno, se falava mais ou menos, se assistiu mais ou menos às aulas, se o conheci melhor ou pior. Acho mais justo assim.

De modo geral, o que eu gostaria de comentar, a respeito de problemas que notei em vários dos trabalhos, é:

1) Confusão freqüente entre mau e mal. Há pessoas que discutem “se o homem é mal”. No caso, o certo seria escrever “mau”. Lembrem que mal é antônimo de bem, e mau de bom.

2) Erro, este sério, que consistiu em afirmar que para Hobbes o homem é mau. No cap. 13 do Leviatã, ele afirma exatamente o contrário. Além disso, nas 3 aulas que dei sobre Hobbes e em pelo menos mais duas, insisti neste ponto.

3) Biografia dos autores ou histórico de seu contexto. Na maior parte dos casos, é inteiramente desnecessário, para o trabalho que foi solicitado. O que se pediu foi que idéias fossem discutidas.

4) Concisão ou prolixidade. Constatei, mais uma vez, que os alunos que extrapolam o limite dado geralmente o fazem porque tiveram dificuldade de ir direto aos pontos, de separar o essencial do secundário, de distinguir idéias principais e detalhes menores.

5) Infelizmente, ao contrário do que foi pedido, alguns poucos trabalhos consistiram em resumos separados dos dois autores escolhidos e, depois, numa rápida comparação entre eles. O que se pediu é que o trabalho fosse redigido já colocando em questão a relação entre os pensadores que fossem selecionados.

6) Conclusão é importante. Um trabalho não deve terminar de forma abrupta.

Recuperação: será o mesmo tema, com as mesmas regras do trabalho pedido.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Trabalho de aproveitamento

Trabalho de aproveitamento

Compare as idéias de dois autores, dentre os estudados no curso, relativamente a dois dos aspectos ou questões abaixo, à sua escolha:

1) O homem é bom?

2) O homem é sociável por natureza?

3) A organização social e política humana deve se orientar pela busca do melhor ou pela redução do pior?

4) Os homens podem se governar de maneira democrática ou não? E, qualquer que seja sua resposta, qual o sentido que está dando à palavra “democracia”?

Observações:

I. Lembrem que são dois autores e dois tópicos.

II. Pede-se uma discussão, não um resumo. Não será aceito o trabalho que se limitar a resumir idéias dos autores, sem discuti-las nem confrontá-las. Explicando melhor: é claro que você precisará resumir as idéias de cada um dos autores, mas o resumo tem de estar orientado pela comparação. Não pode resumir um e depois, outro. Mas pode começar a discutir um dos tópicos e, aí, mostrar o que cada autor pensa, enfatizando os pontos de convergência e divergência.

III. Os trabalhos deverão ser entregues em formato impresso e eletrônico (nos dois formatos e não num único).

IV. A versão impressa deverá ser entregue na secretaria do departamento ou ao próprio professor até o dia 18 de junho. Deve ser exatamente igual à versão eletrônica e ter, no alto da primeira página, o nome do aluno.

V. A versão eletrônica – exatamente igual à impressa – deve ser remetida dentro do mesmo prazo para o e-mail filosofospoliticosmalditos@gmail.com. No item “assunto” do e-mail, deve constar o nome do aluno. O título do arquivo também deve ser o nome do aluno. O trabalho não poderá ultrapassar 10 mil caracteres com espaço.

VI. É responsabilidade do aluno acessar o e-mail que usou para enviar o trabalho, caso o professor tenha alguma dúvida a lhe colocar.

Para além do Iluminismo

Na semana passada, estive em Córdoba, na Espanha, para o encontro da Academia da Latinidade (http://www.uco.es/agenda/actividades/1004/100426a_hermeneutica_y_humanismo.html). Criada por Candido Mendes, a academia pretende desde o início ser um contraponto às políticas de Bush e outros que enfatizaram o conflito em vez da negociação. Tanto assim que vários encontros da Academia tiveram lugar em terras do Islã.
Esta foi a primeira vez que estive numa reunião da Academia. Era a 21a.
Transcrevo o texto que apresentei, em francês.

Les Lumières et au-delà

Renato Janine Ribeiro[1]

Tout bilan favorable des Lumières est tiraillé, depuis un certain temps – je l’ai vu et entendu en 1989, lors des grands colloques sur le bicentenaire de la Révolution française –, par deux forces ou tendances en conflit, voire antagoniques. D’une part on célèbre l’avènement – européen – des idées qui proclament l’égalité des hommes et leur droit indéniable à la liberté. D’autre part on critique l’écart entre ce discours de souche européenne et la pratique des mêmes Européens, qui ont nié l’exercice de ces droits aux peuples qu’ils colonisaient. Si aux Amériques la colonisation européenne prend fin presque en entier le lendemain de la Révolution française – la plupart des colonies d’Espagne et du Portugal s’en déclarent indépendantes entre 1810 et 1822 – la mainmise systématique du Blanc sur le continent africain commence juste après cette période. Si les Latino-américains peuvent donc établir un certain lien, quoique toujours sujet à caution, entre les idéaux des Lumières et leur émancipation, pour les Africains ce rapport est contradictoire, ironique, voire hypocrite. Que la liberté tarde quelques décennies à aller de la Bastille à Bahia (1823) ou à Ayacucho (1824), on le comprend. Mais que l’occupation de l’Afrique, avec son cortège d’infâmies qui comprend les crimes du roi des Belges dans le Congo qu’a dénoncés entre autres Sir Roger Casement, se produise après les Lumières et les indépendances américaines, voilà ce qui ne peut pas s’expliquer par la logique du seul retard. Il s’agit bel et bien d’une contradiction.

Dans le premier cas, il y a continuité entre la parole des Lumières et l’acte d’indépendance des colonies acquises lors de la première mondialisation, celle du 16e siècle. Les mots prennent un certain temps avant de se faire chair. Dans l’autre cas, cependant, il ne s’agit pas d’un délai, mais d’une opposition. Ici les mots ne sont pas lents : ils mentent. Lorsqu’on transmet aux Africains – ou aux peuples des Indes – des idéaux occidentaux dont en même temps on leur refuse la jouissance, témoins le massacre d’Amritsar le lendemain de la Grande Guerre et ceux de Sétif et Guelma à la fin exacte de la II Guerre Mondiale[2], le message qu’on repasse aux Africains et à beaucoup d’Asiatiques n’est pas que la culture européenne porte la justice, même si elle le fait plutôt lentement : mais plutôt que la culture blanche est hypocrite et qu’elle affirme le contraire de ce qu’elle fait. Sa pratique ne tarde pas par rapport à sa parole : sa pratique est la vérité de sa parole, elle montre que celle-ci ment, bref, sa pratique infâme est la vérité de sa parole belle mais hypocrite. Les mêmes principes encyclopédiques qui s’appellent des idéaux en Amérique – ainsi qu’en Europe – ayant pour fonction d’inspirer des actes, ayant donc un sens fortement pédagogique parce qu’ils apprennent à des gens formés dans le sein du despotisme ou sous la férule coloniale un nouvel ethos, deviennent donc idéologie en Afrique et en Asie, parce que dans ces deux continents le discours n’est pas une vraie promesse, il est un leurre. Et c’est pourquoi, il y a de cela un peu plus de vingt ans, les Européens et surtout les Français disaient à leurs collègues étrangers que les libertés que ceux-ci avaient acquises étaient nées des Lumières, tandis que certains Latino-américains, des Orientaux et surtout les Africains soutenaient que les idées encyclopédiques n’avaient pas endigué la méchanceté des colons, pire, elles leur avaient peut-être servi d’alibi. Après tout, l’occupation de l’Afrique s’est faite, au cours du 19e siècle, en invoquant le prétexte de mettre fin à l’esclavage, aux massacres inter-ethniques. Si la colonisation des Amériques invoquait l’idéal de christianisation des peuples païens, trois siècles plus tard celle d’Afrique faisait appel à des idéaux moins locaux, plus universels : Stanley, Livingstone et tant d’autres qui se sont aventurés en Afrique n’oseraient jamais s’appeler des conquistadores. Ils ne ramèneraient pas dans leur pays des animaux exotiques avec des êtres humains également exotiques. Et, s’il leur arrivait de ramener en Europe des animaux exotiques – pour les présenter à des sociétés savantes, jamais à une cour où siégeraient un roi et son fou – ils éviteraient soigneusement de présenter des êtres humains comme si ceux-ci étaient également exotiques. Même s’ils partageaient avec certains colonisateurs du 16e siècle l’idéal d’évangelisation des païens, leur version du christianisme serait dans quelque mesure redevable des Lumières. Ils pouvaient vanter la supériorité du christianisme, comme l’avaient fait les missionnaires en Amérique, mais ce serait pour prêcher un christianisme plus dépouillé, plus humanitaire, moins sectaire que celui qui avait amené des Catholiques en Amérique latine et des Protestants au nord du continent.

Or, c’est exactement cet aspect, disons-le, « bon » de la colonisation plus récente qui la rend intolérable. Celle du 16e siècle s’est perdue dans le passé. Ses justifications ne sont plus de mise. On peut mettre en cause leur bonne foi, on peut dire que pour un Las Casas il y avait maints Cortès et Pizarros, mais tout cela est très loin de nous. Si on condamne ce qu’ils ont fait, le génocide, l’ethnocide, la traite, il n’en est pas moins vrai que les discours qui ont servi de justification à ces pratiques ont cessé d’être prononcés depuis longtemps : l’Encyclopédie, les Révolutions ont eu raison d’eux. J’en cite un seul, L’économie chrétienne des seigneurs pour le gouvernement des esclaves[3], que le jésuite Jorge Benci a publié en 1700 afin d’édifier les seigneurs des plantations brésiliennes : le propriétaire d’esclaves leur doit, dit-il, dans une formule devenue célèbre en Portugais, pão, pano e pau, c’est-à-dire, du pain pour qu’ils mangent et ne dépérissent pas, du tissu (« pano ») pour qu’ils ne marchent pas nus et ne tombent pas dans les péchés de la chair, et du bâton (« pau » : littéralement, du bois), pour les corriger physiquement s’ils manquent à la discipline et les ramener dans le droit chemin. Ce discours s’inscrit dans la droite ligne des doctrines qui sous l’Ancien régime imposaient aux rois et aux gouverneurs en général le droit de corriger les brebis égarées, même si cela impliquait les soumettre à des supplices épouvantables comme le bûcher. Ce qui est remarquable ici est que Benci affirme que pão, pano e pau sont dus aux esclaves, c’est-à-dire, il ne s’agit pas d’un droit qu’aurait le seigneur de les châtier à son gré, mais plutôt d’un devoir qu’il a – envers eux – de les corriger : c’est pourquoi le pain, qui les nourrit, le tissu, qui les habille, leur sont dus autant que le bâton qui frappe leur corps pour sauver leur âme. Or ce discours n’a plus de sens aujourd’hui. Celui qui le tiendrait, on le prendrait pour un fou ou pire. Le discours qui a présidé à la colonisation des Amériques a ainsi perdu son sens, d’une part, et d’autre part celui des Lumières a aidé à notre indépendance. Mais ces idéaux qui se sont avérés plus ou moins émancipateurs en Occident – plus en Europe et en Amérique du Nord, moins en Amérique latine – ont joué un tout autre rôle en Afrique. Dans ce continent ils ont fourni à la colonisation un certain soutien. Il ne faut évidemment pas exagérer et inscrire l’occupation de l’Afrique au 19e siècle dans la filière de l’Encyclopédie. Ce serait absurde. Mais les politiques française et britannique de colonisation au 19e siècle faisaient usage de l’esprit moderne, parfois démocratique. Ce n’est pas par hasard si, une décennie après la fin du Second Empire à Sedan et peu après l’amendement Wallon qui entérine le fait républicain en France, ou plutôt la forme républicaine comme étant celle du gouvernement en France européenne, le mot d’Empire français est déjà rentré dans les habitudes, mais cette fois-ci pour désigner ce qui se passe en-dehors des frontières historiques, « naturelles », nationales. C’est comme s’il y avait en France moderne un besoin d’Empire : à la chute de celui qui restreignait les libertés civiles et politiques de citoyens français réduits à la condition de simples sujets, s’ensuit l’établissement d’un Empire, non plus à l’intérieur de la métropole mais à son extérieur, qui assure une image de grandeur à la France. On y voit peut-être le secret, la contradiction intérieure de ce qu’on pourrait appeler le désir d’Empire: l’Empire éteint les libertés civiles, il réduit les gens à une sorte de captivité ; or, les Français n’en veulent plus ; cependant, en même temps il assure la gloire, il octroie à un pays européen de taille moyenne une place de choix comme l’une des deux, trois grandes puissances du monde ; mais comment avoir en même temps la gloire et la liberté ? Comment garder de l’Empire ce prestige dont chacun peut se vanter, mais sans avoir à se courber devant des potentats idiots ? Après coup la solution qu’on a prise semble très simple : il suffisait de séparer gloire et servitude, de trancher le rapport qui les unissait ; auparavant les soldats qui servaient les Empereurs des Français en tiraient de la gloire ; grandeur et servitude étaient le lot des militaires ainsi que de tous les citoyens-sujets des deux Empires que s’est successivement donnés la France. Maintenant la gloire ira aux Européens, tandis que la servitude sera imposée aux colonisés. L’Empire colonial apportera de la gloire, et bien sûr des richesses, à la France républicaine. Mais cela au prix de nier aux colonisés les droits républicains les plus élementaires. Un exemple tardif et grave, parce qu’il s’applique à cette Algérie départementalisée à l’instar de la métropole, dont on disait en 1950 qu’elle était la France[4], est celui des collèges électoraux séparés pour les les Arabes et les Français qui vivaient dans la colonie, où le vote des premiers ne valait qu’une fraction de celui des Blancs. Cela s’est d’ailleurs produit partout : la colonisation niait les valeurs qui étaient inscrites, sous le nom de Déclaration des droits de l’homme et du citoyen, dans la culture et depuis 1946 dans la Constitution française. Mais notre question n’est pas que l’Encyclopédie ait été ignorée, méprisée, méconnue : si cela était, notre problème serait moins grave ; il suffirait qu’elle cesse d’être bafouée pour qu’elle porte ses fruits. Ce qui nous inquiète, c’est autre chose : c’est que les idées de l’Encyclopédie aient partagé la couche de l’oppression ; que le discours des droits de l’homme ait coexisté avec la pratique de l’asservissement de millions de personnes, voire qu’il l’ait légitimée. Voilà le problème : l’Encyclopédie aura-t-elle servi, même à son insu, aux pratiques qu’elle condamnait ? Aura-t-elle été un grand alibi à la réduction en captivité des colonisés de la « seconde vague », celle du 19e siècle ?

***

S’il y a un moment où les idées connaissent leur apogée, c’est bien celui des Lumières. Il peut y avoir eu, avant ou après, des époques plus riches en intelligence. Pourtant ce qui est en question ici n’est pas la qualité des idées, mais leur rôle. Or c’est au 18e siècle que se consacre la conception que des idées puissent changer le monde – et le changer pour le rendre meilleur. Cela implique que ces idées deviennent des idéaux. Mais là est notre problème : les idées par excellence, celles des Lumières, sont-elles des idéaux, des phares qui nous préparent vers l’avenir – ou plutôt des idéologies ? Ni l’idéal ni l’idéologie ne reflètent pas ce qui existe. Le propre de l’idéal est qu’il ne propose pas un portrait de ce qui existe maintenant, mais une image puissante de ce qui peut et/ou doit se passer à l’avenir. Le propre de l’idéologie est qu’elle invente un monde merveilleux afin de mieux faire passer la mesquinerie du monde. Le projet, l’idéal possède une valeur étique. La fausse merveille, par contre, même si elle nous éblouit esthétiquement, est négative du point de vue étique. Donc, le poids qu’on donnera aux Lumières sera bien différent selon le rôle qu’y joueront les idées. Si on accepte l’hypothèse que dans certains endroits les idéaux ont servi à la captivité et non à l’émancipation, alors les Lumières ne pourront pas être prises en compte toujours, systématiquement, comme des signes avant-coureurs de la liberté. Il faudra bien vérifier non seulement ce qu’elles disent, mais ce qu’elles font, ou ce qu’on en a fait.

La critique des idéaux est menée par Machiavel, celle des idéologies par Marx. Tous les deux constatent une dissonance entre ces belles idées et la réalité. Il faut préciser que cette dissonance ne signifie pas qu’elles reflètent mal la réalité, parce qu’ici on ne parle pas de connaissance, mais d’action : ni les idéaux ni l’idéologie ne représentent ce qui est ; ils disent ce qui doit être, ce qui peut être ; ils parlent de l’avenir, possible ou nécessaire, plutôt que du présent ; si dissonance il y a, elle n’est pas que cognitive, elle concerne surtout l’action. Tout beau discours est trompeur, là sont d’accord nos deux auteurs. Les belles paroles séduisent, et par là elles entravent la liberté d’agir. Mais qui est trompé par elles ? là divergent Machiavel et Marx.

Pour Machiavel les beaux discours auxquels peut croire un prince lui menottent les mains ; s’il croit vraiment à la morale, surtout chrétienne, s’il fait preuve de mansuétude, il sera incapable d’agir, il ne tiendra pas son état de prince, il ne préservera pas l’Etat qu’il gouverne, ce stato qu’il doit mantenere. Chez Marx, au contraire ou presque, les beaux discours masquent la réalité des actions du prince – ou de ses héritiers conceptuels, la « classe dominante » ; ce sont eux précisément qui assurent l’efficacité de ses actes ; c’est justement parce que tous croient à ces mots un peu vides ou assez faux que la classe dominante maîtrise le politique. Disons donc que chez Machiavel le prince se trompe, chez Marx la classe dominante trompe les autres ; les beaux discours affaiblissent le prince, d’après Machiavel, mais pour Marx ils renforcent le pouvoir des dominants sur les dominés. Dans les deux cas la myopie est cause de défaite, mas elle n’affecte pas les mêmes sujets. Il y a myopie du prince chez Machiavel, il y a myopie des citoyens chez Marx. Mais le mensonge lui-même ne prend le devant de la scène que chez le penseur allemand. Pour son prédécesseur florentin il y a mauvaise perception du politique chez les princes qui croient que des Etats puissent être chrétiens en entier, mais ces princes ne trompent pas autrui, ils se trompent eux-mêmes. Chez Marx, par contre, la classe dominante crée une phantasmagorie qui lui permet de tenir un pouvoir qui est plus fort que celui que s’imaginait Machiavel, du fait qu’il n’est pas que politique, il comprend aussi et surtout l’économie. Mais il s’ensuit un problème : est-que la classe dominante croit à son idéologie ? Ment-elle ? Or celui qui ment sait qu’il ne dit pas la vérité. Pour que mensonge il y ait, il faut que le menteur en soit conscient.

Le mensonge peut évidemment avoir sa place chez le prince machiavélien. S’il se trompe lorsqu’il croit aux idéaux, par contre, parfois il ne réussit dans son entreprise de domination que parce qu’il a menti. Nous lisons dans Il principe des récits de princes qui ont su détruire leurs rivaux en les attirant dans un guet-apens. Mais ces mensonges, très ponctuels, sont loin de la phantasmagorie qui est le statut du discours idéologique chez Marx. Pour y arriver il aurait fallu que Machiavel ait passé par le baroque. Une chose est de vous dire venez, je vous recevrai les bras ouverts, oublions nos querelles passées, et ensuite de vous tuer ; tel est le mensonge chez Machiavel. Une autre chose est de construire tout un théâtre qui enveloppe l’autre dans une représentation complète du monde : le futur cardinal de Retz est emprisonné du temps de la Fronde dans le château de Nantes ; il s’aperçoit que sa fuite est impossible, mais il sait aussi que le château a un seul prisonnier, lui-même ; il cache des aliments sous un escalier, il combine avec des amis qu’ils feront du bruit autour du château, qu’ils y laisseront une échelle, qu’ils partiront à cheval en tirant vers l’air et que l’un d’eux s’habillera comme lui, tandis que lui, il restera dans le château ; ses gardiens sont dupes de cette pièce de théâtre habilement menée, ils croient qu’il est parti – tandis qu’évidemment il se cache sous l’escalier – et quelques jours après, Gondi quitte le château par la porte principale, sans que personne ne se rende compte de son identité. Du moins est-ce ce qu’il nous raconte dans ses Mémoires... Ou bien un penseur, le premier grand philosophe de la modernité, s’imagine que toutes ses perceptions sont l’oeuvre d’un être tout puissant, un malin génie, qui s’évertue à le tromper : voilà le baroque. Le mensonge du prince de la Renaissance – venez, mon ami, puis je vous tue – est trop simple devant des mises en scène aussi élaborées. L’idéologie chez Marx hérite de ces formes plus riches, complexes, qu’a développées le baroque, créateur d’un véritable faux monde alternatif. Or cela implique une question importante et supplémentaire : s’agit-il d’un mensonge ? Du fait que l’idéologie offre une image « fausse », un « masque » du monde, Il est assez fréquent qu’on s’imagine qu’elle est le fruit d’un complot, qu’elle aurait été composée par un comité de la classe dirigeante dans le but de tromper les dominés et de par là s’assurer sa domination. L’idéologie est alors réduite à un mensonge. Mais est-ce une description convenable de l’idéologie ? Peut-on s’imaginer que les collaborateurs de Walt Disney auraient créé les personnages de Donald, Picsou, Mickey dans le but conscient d’asseoir le triomphe de l’idéologie capitaliste sur les enfants[5]? Ou plutôt la construction de l’idéologie aurait bien pour résultat d’établir une domination, mais sans que cela résulte d’une opération consciente de tromperie, de quelque chose de délibéré – bref, d’un mensonge. Probablement la grande spécificité de l’idéologie réside précisément dans le fait qu’elle n’est pas un mensonge ; elle n’est pas créée de toutes pièces ; elle va plus loin que le théâtre baroque, parce qu’elle n’a pas de créateur au sens où quelqu’un l’aurait inventée sans en être dupe. Probablement, pour engendrer une idéologie réussie, il faut y croire.

Pour reprendre notre question : si les Lumières sont un idéal, on peut les renforcer là où elles sont encore faibles. Tout tient à ce mot, encore. Il nous fait penser que des développements sont possibles. Le suffrage est loin d’être universel, l’inégalité des sexes a mené à la guillotine Olympe de Gouges, les travailleurs n’ont pas de droits – mais le monde que je décris par ces rapides esquisses, celui du début du 19e siècle, est capable d’un progrès, qui mènera, comme d’ailleurs il a mené, au suffrage de tous les adultes, à l’égalité des femmes, aux droits sociaux, à la suppression des monarchies et à la diffusion des formes démocratiques de gouvernement. Par contre, si on suppose que les Lumières relèvent essentiellement de l’idéologie, alors elles entravent le changement historique. Elles sont un leurre. Les concessions qu’elles accordent, voire celles qui s’y ensuivent, ne touchent pas à l’essentiel. Le problème, là, est de savoir ce qu’est cet essentiel. Du fait que nous pensons surtout à ceux qui sont les laissés-pour-compte de l’Occident, à cet Autre de l’Occident qui a été réduit à la condition coloniale après et non avant les Lumières, il faut se demander si des pas en avant politiques en Occident ont impliqué des pas en arrière ailleurs. On peut se souvenir que le même John Locke qui soutenait la liberté comme droit naturel et qui dans son Deuxième traité sur le gouvernement (1690) ôtait toute justification possible à la réduction en esclavage des enfants des captifs[6], reconnaissait dans les Constitutions qu’il a écrites pour la colonie de la Caroline la réalité et la légalité de l’esclavage héréditaire des Noirs. Cette contradiction est fréquente en politique, même si celle-ci n’obéit pas exactement au paradigme de l’idéologie : pour qu’idéologie il y eût, il aurait fallu un discours qui ne soit pas que contradictoire : Locke pourrait peut-être concilier son esclavage « philosophique » du Deuxième traité, où le captif est un condamné à mort qui bénéficie d’un sursis, avec un esclavage paternaliste en Caroline, où les Noirs seraient l’objet d’une graduelle intégration au monde moral, chrétien, adulte : au fait, il serait très difficile de justifier que tous les esclaves « empiriques », ceux du monde réel, soient des condamnés à mort dont l’exécution a été ajournée sine die, et absolument impossible d’attribuer cette condition à leurs enfants nés en captivité. Et c’est ce discours plus condescendant, celui dont le père Jorge Benci S. J. que nous citions il y a quelques pages est l’un des meilleurs auteurs, qui triomphera à la fin, tandis que l’idée de l’esclave promis à la mort, même si elle s’inspire d’une tradition philosophique plus longue – on la voit chez Locke mais avant lui chez Hobbes – n’aura pas d’usage en-dehors des traités de philosophie politique : elle n’imprégnera même pas, surtout pas, les traités de droit. De toute façon, toute une série de discours libéraux coexiste avec des pratiques qui ne le sont pas du tout ; il ne nous reste que deux possibilités, ou bien les discours finiront par prévaloir, ou bien les pratiques ; dans le premier cas les discours sont porteurs d’avenir, les idéaux peuvent vaincre les actions humaines encore en retard ; dans l’autre tout se résume en acta non verba : les mots ne valent pas grand-chose, seuls comptent les actes. C’est par là que la critique a été adressée pendant un certain temps aux discours des Lumières, au libéralisme européen et ensuite nord-américain.

***

Il est d’assez mauvais ton d’introduire dans une discussion philosophique des événements historiques comme s’ils devaient y tenir le rôle d’un juge ex machina. Il faudrait plutôt réfuter des discours par d’autres discours, des paroles par des concepts. Mais il n’en est pas moins vrai que, si on fait aujourd’hui le bilan – certes provisoire, comme tous les bilans, à l’exception de ceux qui attestent une faillite définitive – de ce qu’on exposait dans les pages qui précèdent, les alternatives aux Philosophes n’ont pas été porteuses d’avenir. Quelques-uns pourraient encore accuser les Lumières de ne pas avoir tenu toutes leurs promesses. Mais la voie de la liberté et celle de la démocratie ne connaissent pas de terminus : on peut toujours demander davantage. Donc, à la limite on pourrait répondre, à ceux qui critiquent une démocratie insuffisante, que le propre du démocratique est de ne jamais suffire ; que la démocratie est un régime de la demande croissante, intarissable même ; que lorsqu’on parle droits, on ouvre une boîte de Pandore (au bon sens du mot) qui ne se refermera jamais ; que dès qu’on mise sur l’ouverture, on abandonne toute possibilité de clôture ; que donc le caractère non terminé, non accompli, inachevé de la démocratie peut bien occasionner des insatisfactions, mais celles-ci sont une qualité plutôt qu’une faille de la démocratie, son atout plutôt que son handicap. Ou pour tenir un discours moins philosophque que pragmatique, que le chemin qui a pris les Lumières comme porteuses d’idéaux a produit de meilleurs résultats que celui qui les accusait de servir d’alibi. Il semble qu’aujourd’hui extra libertatem nulla salus est, pour proposer une paraphrase du célèbre mot d’Origène d’après lequel en-dehors de l’Église il n’y aurait pas de salut. La liberté peut ne pas être une condition suffisante pour le bonheur ou le bien-être des humains, mais sans aucun doute elle s’en est montrée la principale condition nécessaire.

Cela signifie que pour aller au-delà de l’Encyclopédie il faut passer par elle. Est-ce possible ? Le grand problème qui se pose pour les idéaux des Lumières peut se résumer en une phrase : ils prônent une autonomie radicale de la personne morale, conçue comme un individu. Tous les liens qui nous attachent aux autres, s’ils ne sont pas endossés par notre choix libre et éclairé, ne sont que des fers. Il faut les mesurer – les « juger », dirait Kant. C’est pourquoi la justification des bourreaux nazis, d’après laquelle des ordres sont des ordres qu’ils ne faisaient qu’obéir, est inacceptable. Dans leur procès, dont le plus célèbre fut celui d’Eichmann, les accusés étaient interpelés en tant qu’individus autonomes, un rôle qu’ils refusaient. Évidemment ils désiraient se sauver de la potence en se proclamant irresponsables, mais ce que leurs juges les sommaient d’assumer était leur liberté. Ils étaient responsables de leurs crimes parce qu’ils auraient été libres de les pratiquer ou non. A la remarquable exception de Speer lors du grand procès de Nuremberg, presque tous ont préféré se dire des incapables, ce qui ne les a d’ailleurs pas sauvés de l’exécution infâmante. Or, que ce soit dans les jugements des nazis ou dans le cabinet d’un psychanaliste, ce qui est extrêmement moderne est de vous sommer d’assumer votre liberté, de vous dégager de toute justification qui passerait par votre attachement à autrui, bref, de faire remonter toute association à laquelle vous appartenez à un choix que vous auriez fait mais que vous auriez également pu ne pas faire.

Le problème est que dans d’autres cultures l’appartenance à un groupe peut avoir une importance nettement plus grande qu’en Occident.

Retournons aux indépendances du 19e siècle, presque toutes en Amérique du Sud et centrale. Or même en Amérique latine, cette « Europe dissidente » où les valeurs des Lumières ont aidé à l’indépendance[7], la contribution des Philosophes à l’émancipation nationale n’est pas allée sans problème. Les Pères de nos patries étaient certes imbus de valeurs modernes. Les « Inconfidents » du Minas Gerais, en 1789, avaient dans leurs bibliothèques des livres français interdits[8]. On peut dire le même de plusieurs autres libérateurs des Amériques. Mais dans ces sociétés les personnes instruites dans la culture moderne, celles qui pourraient faire usage politique des idées des Philosophes, étaient minoritaires par rapport aux Indiens et aux descendants des Africains. S’il devait y avoir une démocratie, le « demos » serait composé majoritairement de personnes dont la culture n’offrait guère de place à l’idée d’individu. Cela signifie que ou bien les nouveaux Etats s’ouvriraient aux ethnies non européennes, ce qui rendrait difficile leur construction d’après les modèles qui se dessinaient en Grande-Bretagne, aux Etats-Unis et en France, ou bien les couches les plus pauvres seraient dominées et réprimées par la minorité d’origine européenne – ce qui a été finalement le cas. S’il est nécessaire de critiquer cette indépendance qui a rapidement glissé vers l’oligarchie, il faut également noter que toute alternative serait difficile. Le seul Etat où les anciens esclaves ont pris le pouvoir, Haïti, n’a pas été une histoire de succès. Cette scène originale des independencias explique sans doute pourquoi on a alterné, pendant un siècle et demi, entre des démocraties à citoyenneté restreinte, parfois très restreinte, et des régimes d’exception parfois cruels. Comment avoir la démocratie – ou au moins une forme plus libre de gouvernement que celle associant monarchie, colonialisme et esclavage ou encomiendas – si on amputait le « demos » de la majorité de la population ? et comment bâtir un Etat moderne avec des populations dont l’identité n’était pas fondée sur l’individu ? Telle a probablement été la tragédie des indépendances latino-américaines, faisant en sorte que les discours des Lumières étaient souvent tenus par des caudillos, des seigneurs d’esclaves, des oligarques, bref, par des leaders qui dans leur pratique ne suivaient point les idéaux dont ils se targuaient[9].

Mais dans les deux siècles qui se sont passés beaucoup a changé. A la seule exception de l’importance qu’on accorde à l’identité individuelle ou groupale, les valeurs des Lumières sont de plus en plus requises non seulement par des cultures dissidentes, mais également par celles qui sont complètement non-occidentales. Les manifestations à Beijing après la mort de Chou En-Lai, em 1976, c’est-à-dire lorsque le pouvoir chinois était encore aux mains des héritiers de la Révolution culturelle qu’on surnommerait plus tard « la Bande des quatre », montraient que des masses chinoises importantes désiraient des formes démocratiques censées être occidentales ; ces meetings ont contribué à éroder la méfiance que quelques Occidentaux, surtout mais pas seulement à gauche, éprouvaient vis-à-vis ce qu’ils considéraient comme l’exportation des valeurs de l’Ouest vers l’Est. En 1989 les manifestations sur la place Tien An Men ont de nouveau exposé au monde que des valeurs d’origine européenne pourraient être devenues universelles. A la même époque la chute des régimes communistes en Europe signalait qu’un modèle – dont les contours ne sont pas précis et qui peut et doit être constamment redessiné – de démocratie s’imposait. L’alternative communiste disparaissait, en même temps que les espoirs qu’on pourrait éventuellement avoir déposés sur un socialisme marxiste démocratique, c.à.d., une démocratie où il n’y aurait pas de propriété privée des moyens de production (cette idée est aujourd’hui rejetée vers les utopies[10]). Mais, de toute façon, même si au cours des derniers vingt ans beaucoup ont identifié démocratie et capitalisme, ce qui mobilise les partisans de la liberté et des droits de l’homme est la démocratisation de la société et de l’Etat. Si le capitalisme souvent l’accompagne, il ne suscite pas le même enthousiasme. Même ceux qui soutiennent que sans économie de marché il n’y a pas de démocratie proposent un rapport entre les deux qui est celui de moyen et de la fin. D’ailleurs, si le capitalisme est pour l’instant le régime le mieux à même d’assurer des libertés démocratiques, cela ne signifie pas que leur rapport soit nécessaire et exclusif de tout autre. Le capitalisme a bien été capable de soutenir des dictatures ; il n’est donc pas essentiellement démocratique ; sa fidélité à la démocratie n’est pas sans fissure ; alors pourquoi demanderait-on à la démocratie une fidélité, une allégeance au capitalisme que celui-ci ne lui retourne pas ?

Si la Chine en est restée à l’expression d’un désir de démocratie avorté par de successives répressions, la chute des dictatures « de droite » en Amérique latine et de celles « de gauche » en Europe de l’Est, entre 1982 et 1991, a redessiné l’atlas politique mondial. Mais peut-être l’apport théorique le plus intéressant à la nouvelle poussée démocratique, celui qui permet de tenir compte et des idéaux des Lumières et des valeurs importantes des sociétés peu ou non européennes, nous est venu d’Afrique du Sud. Lorsque son premier gouvernement démocratique décide de créer un Comité pour la vérité et la réconciliation – une initiative brillante et qui tranche en même temps avec le modèle de Nuremberg et avec celui de l’expulsion des Pieds-Noirs d’Algérie[11]– le mot-clé choisi est ubuntu, qui dans les langues bantoues signifie quelque chose comme je ne suis que par vous, je suis ce que je suis parce que j’appartiens à un groupe, à une collectivité ; une autre traduction possible, intéressante parce qu’elle s’oppose directement au grand principe occidental qu’est le cogito cartésien (« je pense, donc je suis ») est « nous sommes, donc je suis ». Ce même nom est repris d’ailleurs par les auteurs innombrables de ce grand projet collectif qu’est Linux, pour nommer l’un de leurs logiciels. Dans ce contexte l’idée que le choix individuel prime l’appartenance à un groupe risque de signifier assez peu. Une ébauche de compromis qui consisterait à se dire j’appartiens à ce groupe parce que je l’ai librement choisi rate l’essentiel d’une identité collective qui précède toute forme de liberté. Peut-être l’essai plus intéressant qu’on mène de nos jours dans ce but est celui qu’a posé la Constitution de Bolivie promulguée en 2009, et qui institue presqu’une quarantaine de différentes jurisdictions légales. Chaque citoyen de Bolivie répondra de ses actes criminels ou de ses intérêts économiques devant une cour de son ethnie (il en existe une, supplémentaire, pour ceux qui ne sont pas Indiens). Contre cette norme on a brandi l’épouvantail de l’insécurité juridique et celui de la desagrégation nationale. Mais il est assez probable que les justices indigènes soient saisies surtout pour proposer une solution des conflits qui passe par la conciliation plutôt que par la répression. Il est possible que ce soit l’essai le plus poussé afin de donner réalité, dans une société étatique, à une idée de Claude Lévi-Strauss. Le grand anthropologue dont l’oeuvre est aux racines de l’Unesco disait il y a plus d’un demi-siècle que les sociétés blanches tendent à l’« anthropoémie », c’est-à-dire à l’exclusion du criminel, qu’on enferme ou on exécute, tandis que celles « sauvages » seraient plutôt « anthropophages », c’est-à-dire qu’elles cherchent à intégrer le criminel dans leur sein[12]. Il semble que le pari de la création d’un nouveau système légal et judiciaire qui tienne compte des valeurs d’une majorité de la population de souche indigène vise à renforcer des procédés de conciliation et d’intégration, ce que le système légal occidental n’a pu faire. Attaquer son prochain en justice est compris par nous presque comme une déclaration de guerre, qui entraîne l’appel à un avocat, l’intervention du parquet, la décision par le juge et tout cela pour appliquer la lettre de la loi. Malgré les efforts de beaucoup de penseurs et d’activistes du Droit, celui-ci reste une instance assez froide ; il incarne un paradoxe : les moyens qu’il nous offre pour la résolution des conflits créent de nouveaux conflits, de nouvelles tensions, même si celles-ci restent en sourdine. Il se peut que le recours à un système où l’importance est accordée à une instance collective à laquelle on appartient – les Anciens, les sages de la tribu, les coutumes – nous offre une intéressante alternative qui pourra éventuellement réduire vraiment la tension à l’intérieur des sociétés. Mais il faut se souvenir que ces projets, celui qui a réussi en Afrique du Sud et celui qui commence aujourd’hui son itinéraire en Bolivie, ne représentent aucune rupture avec l’héritage des Lumières. Ils ne se limitent pas à lui donner suite, parce qu’ils lui apportent de nouveaux éléments. Mais ils ne brisent pas avec les idéaux des Philosophes. S’il y a encore beaucoup de pays au monde qui n’ont pas encore adopté des formes démocratiques de vie, comprenant les libertés d’expression, d’organisation, de vote, le changement qui s’est plus ou moins complété vers 1990 et qui a fait que pour la première fois dans l’histoire du monde la majorité de la population globale jouisse de ces droits a également signifié que le noyau des valeurs des Lumières est aujourd’hui perçu comme un patrimoine universel, humain à vrai dire[13]. Dans les nouvelles démocraties les libertés « traditionnelles » s’ajoutent souvent à de nouveaux droits. On assiste ainsi à un véritable aggiornamento des Lumières au 21e siècle.



[1] Professeur d’éthique et de philosophie politique à l’Université de Sao Paulo, Brésil, et chercheur du CNPq, Conselho Nacional do Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico.

[2] Amritsar, aux Indes, le 13 Avril 1919 : l’armée britannique tue 379 manifestants sur la place publique. Sétif et Guelma, en Algérie, les jours qui suivent le 8 Mai 1945 : 8.000 Arabes tués par l’armée française (chiffre avancé par la plupart des historiens, mais qui oscille entre quelques centaines et 40 ou 50 mille d’après les sources).

[3] On trouve Economia Cristã dos Senhores no Governo dos Escravos à l’adresse http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/1_Jesuitico/artigo_001.html. Cet ouvrage est parfois présenté comme précurseur de l’abolition de l’esclavage ; l’historienne Silvia Lara a montré qu’au fait il ne conteste ni cette institution ni les punitions physiques infligées aux captifs.

[4] « La Méditerranée traverse la France, comme la Seine traverse Paris », disait un slogan des ans 1950. Il connaît d’ailleurs plusieurs versions, le verbe pouvant être remplacé par sépare ou divise.

[5] Mille autre exemples seraient possibles, mais je pense ici à un livre qui a eu un fort impact au cours des années 1970, Para leer al Pato Donald, de Ariel Dorfman et Armand Mattelart (Buenos Aires : Siglo Vientiuno Editores, 1972). Evidemment je n’ attribue pas aux deux auteurs une interprétation de l’idéologie qui en fait l’oeuvre d’un sujet conscient et délibérément menteur ; mais il est inévitable que beaucoup de ceux qui entrent en contact avec le concept marxiste d’idéologie, et qui le trouvent utile, commencent par le comprendre comme un gigantesque mensonge ; telle a été la réception la plus courante de ce livre ; et plusieurs ne s’émancipent jamais de cette lecture, je le répète, naïve.

[6] « ...Si un homme, par sa mauvaise conduite et par quelque crime, a mérité de perdre la vie, celui qui a été offensé et qui est devenu, en ce cas, maître de sa vie, peut, lorsqu'il a le coupable entre ses mains, différer de la lui ôter, et a droit de l'employer à son service. En cela, il ne lui fait aucun tort (...) Voilà quelle est la véritable condition de l'esclavage, qui n'est rien autre chose que l'état de guerre continué entre un légitime conquérant et un prisonnier ». [Deuxième] Traité du gouvernement civil, trad. française de David Mazel en 1795, ch. IV, par. 23-24. Disponible à l’adresse http://classiques.uqac.ca/classiques/locke_john/traite_du_gouvernement/traite_du_gouver_civil.html. Il va de soi donc que, si les captifs ont théoriquement perdu leur droit (forfeit) à la vie et donc à la liberté, cela ne vaut pas pour leurs enfants. Pourtant, la Constitution de la Caroline (du Nord) datée de 1669 et qui est attribuée à Locke reconnaît l’esclavage habituel, y compris son caractère héréditaire.

[7] Pour l’idée de l’Amérique latine comme une Europe dissidente (ou un Occident dissident), voir notre article « El papel del afecto: una contribución del Tercer Mundo a la teoría democrática ». Cuadernos Hispanoamericanos (Madrid), n. 601-602, p. 7-14, 2000.

[8] Voir p. ex. Eduardo Frieiro, O diabo na livraria do cônego, São Paulo, 1981, pour une étude des quelques 800 livres que possédait, au Minas Gerais em 1789, le père Luiz Vieira da Silva, l’um des conjurés.

[9] Le critique littéraire brésilien Robert Schwarz a su attirer l’attention sur ce phénomène dans son article « As idéias fora do lugar », Estudos Cebrap n. 5, 1973, Sao Paulo, disponible à l’adresse http://www.cebrap.org.br/imagens/Arquivos/estudos_cebrap_3_as_ideias_fora_do_lugar.pdf.

[10] Elle n’aurait peut-être pas été réduite à une utopie privée d’avenir si le printemps de Prague n’avait pas été brisé par les armées communistes. Ironiquement l’invasion d’août 1968 a mis fin au seul espoir que pouvait avoir le communisme de se démocratiser et, par là, de survivre.

[11] Il faut rapidement expliquer ces références. Quelques pays, dont l’Argentine, ont souhaité suivre le modèle de Nuremberg ; les auteurs des crimes contre la démocratie des années 1970 et 1980 – les généraux, les tortionnaires et également certains guérilleros – ont été jugés et condamnés, mais le gouvernement Menem les a graciés (ces grâces ont été annulées par le Congrès en 2003). Aujourd’hui l’héritage de Nuremberg est assumé presque exclusivement par des tribunaux créés par les Nations Unies, afin de juger – très loin de la scène des crimes – les actes de certains génocidaires du Rwanda, de l’ex-Yougoslavie etc. Le modèle sud-africain tranche avec l’idée de punition et prône la réconciliation, sous condition que toute la vérité soit avouée par les criminels, si honteuse soit-elle.

Mais l’Afrique du Sud avait une autre péculiarité qui la rendait distincte des pays où le modèle de Nuremberg a eu ou a lieu et la rapprochait de l’Algérie au moment de l’indépendance : c’était la présence sur son sol d’une importante minorité ethnique qui avait bénéficié de l’oppression raciale. Or l’expulsion des Pieds-Noirs d’Algérie a été un trauma dont ce pays ne s’est jamais relevé. Même si on pouvait les dire coupables de l’oppression raciale « par association », ils auraient été nécessaires à la construction d’un nouveau pays. Or, en réduisant la punition des grands responsables à un minimum et en rassurant les autres Blancs qu’ils n’avaient rien à craindre du nouveau pouvoir, Nelson Mandela a évité un scénario de vengeance à l’algérienne qui aurait rendu pratiquement impossible la construction de la nation sud-africaine. Pour y arriver il fallait plus ou moins remplacer une idée « moderne », « occidentale » de justice par une idée différente, tribale et en même temps extrêmement nouvelle, celle de l’intégration des opposés, des opposants, voire des criminels repentis.

[12] « Je pense à nos coutumes judiciaires et pénitentiaires. À les étudier du dehors, on serait tenté d'opposer deux types de sociétés : celles qui pratiquent l'anthropophagie, c'est-à-dire qui voient dans l'absorption de certains individus détenteurs de forces redoutables, le seul moyen de neutraliser celles-ci et même de les mettre à profit ; et celles qui, comme la nôtre adoptent ce qu'on pourrait appeler l'anthropoémie (du grec émein, vomir) ; placées devant le même problème, elles ont choisi la solution inverse, consistant à expulser ces êtres redoutables hors du corps social en les tenant temporairement ou définitivement isolés, sans contact avec l'humanité, dans des établissements destinés à cet usage. À la plupart des sociétés que nous appelons primitives, cette coutume inspirerait une horreur profonde ; elle nous marquerait à leurs yeux de la même barbarie que nous serions tentés de leur imputer en raison de leurs coutumes symétriques ». Claude Lévi-Strauss, Tristes Tropiques (1955), Éd. Plon, 1993, pp. 447-448.

[13] En anglais on dirait human et humane.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Como a ecologia está mudando o pensamento - 3a dia 4 de maio à tarde

SUSTENTABILIDADE
Como a preocupação ecológica está
mudando a forma de estar no mundo

SANDRINE LAGE é jornalista, mestre em sustentabilidade pela Escola de Ciências Aplicadas da Universidade de Cranfield, Reino Unido. É autora do livro "Sustentabilidade na Mídia: o Poder de (In)Formar" (2009). Escreve com regularidade para publicações portuguesas e brasileiras. Fundou a Sperantia, em Portugal, empresa que busca divulgar as melhores práticas promotoras da sustentabilidade.

Defender o meio ambiente deixou de ser, se é que um dia foi, uma preocupação apenas com a preservação da natureza. Torna-se cada vez mais uma ética, um estilo de vida, e está metamorfoseando as relações de cada indivíduo com as pessoas próximas, com a política, com a sociedade.

A jornalista Sandrine Lage, especialista em sustentabilidade, tratará dessa transformação na conferência "A Importância da Preocupação Ecológica para uma Transmutação na Forma de Estar no Mudo", no dia 4 de maio, às 14h, no IEA. O evento será coordenado por Renato Janine Ribeiro, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e conselheiro do IEA.

PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS

Alguns estudos de caso, como o realizado por Lage sobre o jornal inglês "The Guardian", permitirão desenvolver a forma pela qual a ecologia se mostra tão fecunda na construção de um novo mundo. Essa mudança não se traduz apenas no surgimento de conteúdos sobre o meio ambiente, mas também na adoção de práticas sustentáveis na própria indústria, com o seqüestro do carbono produzido pelas máquinas e outras iniciativas.

A discussão sobre esse papel da preocupação ecológica não é possível sem uma abordagem fortemente interdisciplinar. A questão ambiental impregnou todas as esferas da vida e isso exige que se pense de maneira completamente inovadora, adotando uma abordagem que rompa com o pensamento dominante até o momento.

LOCAL: Auditório Alberto Carvalho da Silva, sede do IEA, Rua da Reitoria (antiga Travessa J), 374, térreo, Cidade Universitária, São Paulo (mapa).
WEB: transmissão ao vivo em www.iea.usp.br/aovivo.
INFORMAÇÕES: com Inês Iwashita (ineshita@usp.br), tel. (11) 3091-1685.
NAO HAVERÁ INSCRIÇAO PRÉVIA

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Hobbes

Para as aulas sobre Hobbes, leiam:
1. Leviatã, de Hobbes, com ênfase nos caps. 4, 5, 13, 14, 17, 21, 24 e 30, bem como a revisão e conclusão do livro;
2. Do cidadão, de Hobbes, ed. Martins Fontes, para uma argumentação mais apurada do que ele escreveu;
4. Transcrevo a introdução que escrevi à trad. brasileira do Behemoth:

Prefácio: A mídia do Dezessete

Renato Janine Ribeiro

I

Por que um filósofo como Hobbes, que passou boa parte da vida criticando as metáforas, figuras e imagens, e mais que isso, responsabilizando-as pela subversão e pela guerra civil, dá a duas de suas obras títulos que evocam monstros? À primeira vista, haveria maior sentido em utilizar, ele, títulos que fossem puramente denotativos, dos quais a alusão, o figurado, a imagem estivessem ausentes. Isso, aliás, ele fizera com total êxito no Do cidadão, em 1642, para citar apenas um livro. E a coisa é ainda mais curiosa porque os comentadores não encontram muita facilidade em decifrar o que ele quis dizer da política com os dois monstros. Do Leviat㸠é verdade que se chegou a um razoável consenso: Hobbes escolheu o monstro citado no Livro de Jó porque ele reina sobre os filhos do orgulho, e nós, humanos, somos antes de mais nada movidos por nossa vaidade, pela noção vã que temos de nosso valor; é esta, por sinal, a terceira causa da guerra generalizada entre os homens, da “guerra de todos contra todos” [1]. Contudo, por que enquanto um monstro bíblico designa o poder possível e necessário sobre os homens vãos, outro aponta a desagregação de todo o poder, em mãos do clero?

Não é clara a razão de se escolher o Behemoth bíblico [2], contra o igualmente vetero-testamentário Leviatã. Contudo, podemos sugerir pelo menos um esboço de resposta, que consiste no seguinte. Primeiro, Hobbes insinuaria que vivemos entre duas condições monstruosas, a da paz sob o governo absoluto (ou melhor, o governo de um soberano) e a da guerra generalizada, isto é, o conflito intestino, que lança irmão contra irmão. A guerra de todos contra todos é na verdade a guerra civil, pior do que qualquer outro conflito, porque na guerra externa pode haver uma produtividade, uma positividade: afinal, Hobbes é mercantilista, e para essa escola econômica a guerra estrangeira pode servir de excelente meio para se acumular um superávit em metais preciosos, tão bem ou mesmo melhor que o próprio comércio externo. (A guerra é a continuação do comércio por outros meios, já se disse a propósito do mercantilismo). No conflito doméstico, porém, não há produtividade, só destruição. Ele é a potência do negativo. Contudo, se a destituição de todo referencial constante, a universalização da desconfiança compõem uma condição monstruosa, a superação desta passa igualmente por uma monstruosidade, que é o poder pleno conferido a uma pessoa [3], o soberano. Há monstro no poder de Estado, antes de mais nada em sentido literal, por ser ele algo que salta aos olhos, prodígio ou coisa incrível, que se mostra de modo a nos impressionar; e também porque sobre sua ação paira um elemento incondicionado, imprevisto e imprevisível, que passa pelo temor mas pode converter-se em terror. Hobbes fala em fear e em awe, que não designam um medo desmedido, mas um respeito, uma reverência, um temor que têm sua razão de ser; seu soberano não é um déspota, um sultão que governa pelo pavor; mas o fato de ter escolhido, para representar esse poder, um monstro ajudou a fortuna crítica a pensar o poder pela desmedida, pela plenitude de mando transbordando por vezes a ponto mesmo de incutir o medo irrestrito.

Segundo, e indo mais precisamente para o livro de nome Behemoth: a guerra de todos contra todos não é apenas, como afirma Hobbes no Leviatã, uma condição em que não temos certeza de que o outro cumpra os pactos que firmou, e em que atacá-lo é portanto a melhor linha de ação a se seguir. O capítulo XIII do Leviatã descreve uma situação de guerra, como, antes dele, o cap. I do De Corpore Politico e o igualmente o I de Do cidadão, e aponta suas causas. Mas – curiosamente – é o Behemoth, livro de menor pretensão teórica, que vai mostrar com maior precisão como e por que se produz a condição de guerra: o clero é seu principal responsável. A guerra de todos não é uma simples hipótese a servir de contraponto – ou álibi – à paz instaurada pelo poder soberano. Ela é produzida, antes de mais nada, pela desmedida da palavra que finge deter as chaves de acesso à vida eterna. Se o poder do governante é forte, ele é, porém, um poder apenas laico, somente racional, se não for além do temporal e não controlar, também, o espiritual. Os diversos cleros, ao pretenderem um acesso próprio às coisas espirituais, impõem decisivo limite à autoridade do soberano. Por isso, este não pode ser laicizado, nos temos em que hoje conceberíamos. Ele precisa ser um poder temporal e espiritual, como, aliás, se lê no título completo do Leviatã, que é “Leviatã, ou a matéria, forma e poder de uma República Eclesiástica e Civil” (república, claro, num sentido que é mais o de Estado em geral, que o da forma eletiva de seus governantes; mas o que eu queria frisar era o papel religioso, tanto quanto temporal, desse Poder).

Ao contrário do que muito leitor de nosso tempo imagina, o poder mais forte não é necessariamente o da espada visível, o do gládio da justiça e da guerra, que o soberano (leigo) empunha – mas pode ser o de uma espada, digamos, invisível, a da fé e da religião. Se o governante que julga de maneira visível e aos olhos de todos pode infligir a morte física, o clero brande a ameaça da morte eterna, ao mesmo tempo que nos faz antever uma eternidade no paraíso, e esse misto de promessa e amedrontamento pode mostrar-se mais eficaz que o instrumental mais ou menos desencantado com o qual o poder leigo procura controlar as condutas. Dizendo em outras palavras: cita-se, em demasia, a frase que mais ou menos abre a parte II do Leviatã, ou seja, “Covenants without the Sword are but Words”, os pactos sem a espada não passam de palavras; a partir dela se entende que sem a força física, em mãos do soberano, a promessa de nada vale. Mas com isso se esquece que a palavra pode, conforme seja utilizada, deter uma força incomparavelmente maior. É essa palavra descontrolada sobre o Além, ou melhor, essa palavra controlada pelo clero, o grande perigo contra o qual Hobbes escreve, conforme argumentei em Ao leitor sem medo; e daí decorre a importância do Behemoth: aqui se percebe que a condição de guerra generalizada, o conflito doméstico, resulta acima de tudo das maquinações do clero.

E, terceiro, a desconfiança hobbesiana vale contra qualquer clero. É visível que Hobbes concentra seus ataques nos presbiterianos, mas – embora os católicos romanos então vivendo na Inglaterra fossem bastante fiéis ao rei Carlos, e portanto partilhassem a preferência pessoal do filósofo pela monarquia e pelos Stuarts – ele não os poupa em absoluto. Pior que isso: responsabiliza-os por constituírem o que podemos chamar a matriz do poder alternativo, do poder subversivo a que ele chama, na Parte IV do Leviatã, “o reino das trevas”. E da mesma forma a própria Igreja Anglicana, que em Carlos I terá seu primeiro – e quem sabe único, pelo menos em território inglês – mártir, jamais, tanto quanto eu lembre, recebe de sua parte palavras que possamos dizer ternas. Todo clero, isto é, toda categoria de pessoas que se especializa nas coisas espirituais, tende a reivindicar um acesso direto ao divino. Melhor seria que os próprios governantes ditos leigos exercessem igualmente, e em suas pessoas, um ministério religioso: ficaria claro que todo o poder está unido. Evitar-se-ia a divisão do poder, que acaba propiciando uma contradição interna, altamente perigosa.

Com isso, o que pretendi firmar é um ponto, aquele para o qual o Behemoth decididamente contribui: a guerra de todos contra todos não é simples desordem, não é mera carência de ordem. Ela é produzida pela existência, no interior do Estado, de um partido. O conflito intestino não resulta da falência do Estado. Não é efeito de uma falha ou falta. Ele é conseqüência da ação de um contra-poder, que se move nas sombras, e que é o de um clero desobediente. (Mas todo clero tende a ser desobediente).

***

O problema de muitas leituras de Hobbes reside em seu anacronismo: projetam, no filósofo, problemas que não foram os seus, que dificilmente seriam os seus. É o caso da discussão, em certo tempo tão comum, sobre o caráter burguês ou não de nosso autor. Não que fosse, esse debate, impertinente; apenas, conferia importância demasiada a um aspecto de seu pensamento do qual é possível que o próprio filósofo tivesse bem pouca noção. Seu problema crucial, na relação com os atores políticos e sociais de seu tempo, não estava nos capitalistas, mas nos eclesiásticos. O clero, e não o capital, eis o grande ator contra o qual trabalha Hobbes. Identificá-lo é necessário, e para tanto devemos evitar o anacronismo.

Mas nem todo anacronismo é descabido. Certas pontes que lançamos entre os tempos podem ser úteis. Arrisquemo-nos a uma: o clero, no século XVII, é uma mídia de nosso tempo que teria anexado o Além. Imaginemos – talvez não seja preciso esforço excessivo para tanto – uma rede de comunicações de massas que, para completar seu poder, tenha condições de prometer, a seus ouvintes, a salvação, e de ameaçar os desatentos com a morte eterna. Esse duplo papel é o da mídia do Dezessete, o clero: por um lado assegura as comunicações, informando, pregando; por outro, sanciona com os melhores prêmios e os piores castigos quem se mostre refratário ao que ele quer transmitir e domesticar. Assim, somam-se um princípio de aparente descontrole – a circulação desenfreada dos signos, seu movimento escapando à marcação original que lhes garantiria a tutela, o respeito à ordem – e um modo fortíssimo de controle, que é a referência ao divino, o acesso monopolizado ao transcendente, a chave do absoluto sob a forma da dor eterna ou da satisfação igualmente eterna. O segredo do sucesso eclesiástico está aí, nessa soma de subversão e de poder.

Daí que seja a guerra civil o verdadeiro estado de natureza, a genuína ameaça a todos nós, ou pelo menos aquilo contra que Hobbes escreve. Devemos ler o capítulo XIII do Leviatã – essa passagem-chave do anti-aristotelicismo hobbesiano, de sua negação de uma sociabilidade natural, de sua ruptura com nosso espontâneo senso comum que nos faz crer na bondade humana (embora tranquemos a chave nossas casas e nossas economias) – como cifrando esse misto de ordem e de desordem clerical. O verdadeiro problema não estaria na violência privada, de indivíduo contra indivíduo. Essa é, quando muito, um resultado. Sua causa efetiva é a ambição clerical de poder. Em outras palavras, só o clero é capaz de mandar em meio à desordem. Mas é essa ordem escondida o que Hobbes não quer, aquilo em que ele vê a principal ameaça à paz entre os homens. Contra uma ordem que se oculta sob uma aparente desordem, e que por isso mesmo – ao ver de nosso filósofo – engendra e reproduz a desordem, quer Hobbes uma ordem clara, explícita, em um só nível, o da visibilidade. Somente o clero pode ter sua ordem em meio ao que o leigo chamaria desordem. Apenas a profissão eclesiástica está, em meio ao caos, como peixe n’água; apenas ela tem sua ordem devido à desordem. E por isso Hobbes precisa, não podendo laicizar de vez o poder – o que seria anacrônico, reconheço, mas sobretudo ineficaz –, submeter-lhe o espiritual. Seu soberano será, a um tempo, temporal e espiritual: veja-se a capa do Leviatã, com o rei segurando numa mão a espada e, na outra, o báculo. Atacar o clero, desmontar-lhe as pretensões é essencial se queremos a paz.

***

Combater o clero dá-se em duas chaves essenciais. Primeiro, é preciso atacar o clero visível, o causador imediato da desordem: o presbiteriano. Hobbes bem poderia voltar o gume de sua crítica contra os independentes, os sectários dos mais variados: mas estes, embora radicais, nunca detiveram muito poder. É importante notar que nosso autor é mais hostil, não aos radicais nem mesmo aos regicidas em especial, mas justamente ao grupo, digamos, “moderado” na Revolução, que perde o poder já por ocasião do julgamento e execução de Carlos I – ou seja, os presbiterianos. A crítica de Hobbes não prioriza os extremistas, ou os republicanos, mas justamente aqueles que funcionaram como um esboço de “partido da ordem” revolucionário. Foram eles que deflagraram um processo de desobediência que traria todo o mais como seu efeito. Eis a questão, pois: não condenar o radicalismo aparente, porém buscar sua causa. Essa é presbiteriana.

Mas Hobbes vai adiante. Se ainda faz sentido dizer que os presbiterianos foram quem deflagrou um processo que, depois, escapou a seu controle – e se tem pois cabimento responsabilizá–los pelo que depois sucedeu –, nosso autor rompe com qualquer senso comum ao culpar os católicos, em última análise, pelo próprio procedimento presbiteriano. Porque, afinal, faz nexo chamar os sectários e radicais de filhotes dos presbiterianos; mas causa enorme estranheza chamar estes de prole dos papistas. E, com efeito, Hobbes não diz isso com todas as palavras, mas é essa a idéia-mestra sua, já presente nas duas últimas partes do Leviatã: a Igreja Romana é responsável pela oposição, ao legítimo poder soberano, de um poder alternativo, que requer a obediência de todos a seus preceitos sob pena da morte eterna. É essa a matriz que monta todo discurso religioso que se pretenda independente do poder legal.

Com isso, Hobbes se afasta de tudo o que passaria por óbvio. Uma leitura da Revolução Inglesa colocaria os católicos e anglicanos do lado do Rei, os presbiterianos e radicais contra ele e a favor da República. As simpatias de Hobbes, é mais que sabido, estavam com Carlos I. No entanto, de todos esses quatro grupos religiosos um dos menos atacados pelo filósofo será justamente o último, por certo acaso o dos regicidas, enquanto sua ira se dividirá, de forma quase igual, entre papistas e presbiterianos. Nesse livro, aliás, quase todo o tiroteio se dirige contra os presbiterianos, mas no Leviatã a guerra se fazia à Igreja Romana, de modo que as coisas se equilibram. Não há contradição entre os dois livros, neste ponto preciso: Roma fornece o modelo, o presbitério efetua sua aplicação escocesa e inglesa. Os anglicanos, embora monarquistas por definição, têm o risco de todo clero, isto é, sua tendência a se emancipar da necessária união do poder espiritual ao temporal; os radicais, apesar de tudo o que Hobbes desaprova, não foram quem causou os distúrbios – e até se poderia dizer que Hobbes aprovasse, muito mau grado seu, certas medidas de Cromwell, afinal de contas um “independente” em matéria religiosa: a união da Escócia à Inglaterra, a repressão ao papismo irlandês, as guerras mercantilistas contra os Países Baixos, o começo do império colonial pela ocupação da Jamaica, em suma, uma visão mais laica do Poder, ou pelo menos uma maior preponderância do gládio sobre o clero organizado do que se veria quer entre os católicos, quer junto aos anglicanos de Carlos I, quer sob os presbiterianos. O grande problema hobbesiano não é, pois, o da divisão usual que se faz entre dois partidos na Guerra Civil, realistas e parlamentares, nem mesmo entre três, se a esses acrescentarmos, como quer com razão Christopher Hill, os radicais. O ponto que ele afirma e em que insiste é o de pôr fim à tutela dos profissionais da religião sobre os governantes e os cidadãos.

II

Outro ponto que merece atenção nesse livro é que se trata de um diálogo. Mas que estranho diálogo, se lembramos algo do criador da forma, Platão. No começo grego desse gênero, temos pessoas, com nome e biografia pelo menos esboçada, que conversam e, à medida que prossegue sua troca de idéias e de palavras, mudam de opinião e até mesmo crescem: o diálogo platônico é fortemente ascensional. Aqui, porém, só vemos duas personagens, de cuja vida nada sabemos e cujos nomes se reduzem ao basal, ao mínimo, a A e B, num grau zero da personalização. Talvez, pois, nem personagens sejam: apenas, posições. Podemos, do contexto, inferir que um é mais velho e presenciou os acontecimentos que relata, ao passo que outro é, a compensar sua juventude, mais inteligente, já que coloca para o primeiro, senhor dos fatos, questões teóricas. De suas respectivas identidades não se pode supor muito mais que isso. E, se no diálogo grego episódios do cotidiano se sucediam, bem como menções ao aqui e agora que localizavam e datavam a fala, aqui nada há além de política. Do ponto de vista literário, pois, temos um texto sem muito gume, ou pelo menos um diálogo cuja qualidade não resiste, enquanto forma de escrita, ao cotejo com Platão.

Isso não significa, porém, desqualificar o trabalho de Hobbes. Argumentei em outro lugar [4] que, na sua distinção entre dois usos da linguagem, pertence à marca tudo o que diz respeito à produção da ciência, e ao signo o que se refere à circulação de idéias ou palavras. Ora, isso faz que a ciência se realize por completo na solidão do cientista, e que comunicar seus resultados, ou mesmo seus procedimentos, sempre implique, pelo menos, a perda da qualidade científica – já que se descobre no registro da marca, e se transmite no do signo. É por isso que a troca de idéias não pode constituir novas idéias, pelo menos de teor científico. Podemos ter a transmissão de um corpus científico, mas este só torna a ser científico quando o ouvinte reelaborar – como marca – tudo o que aprendeu de seu professor. Assim, o encontro de A e B é quando muito uma transmissão de fatos que se depara com uma teoria mais ou menos pronta, e que se aplica àqueles fatos. Não é, nem poderia ser, uma discussão que gerasse novas teorias. Daí, sem dúvida, o caráter um tanto empertigado do diálogo, ao qual falta vivacidade. Como poderia haver vida, criação do novo, quando só dispomos de duas séries separadas de pensamento e discurso, entre as quais o contato é sempre estanque, externo? Talvez também isso indique o modo como o autor parece ir-se cansando de sua própria obra, já que à medida que escreve o livro vai ficando mais “burocrático”: nos dois últimos diálogos, Hobbes não hesita mais em enumerar fatos, até mesmo dando-lhes números de ordem, ou em arrolar acontecimentos um após o outro, como se se estivesse estancando o espírito de inquietação que precisa estar presente em toda obra filosófica original.

III

Mas isso não quer dizer que o Behemoth não mereça ser lido. Apontar-lhe os problemas, e tentar explicar a que se devem, é o mínimo que de nós exige a honestidade intelectual. Nada disso, porém, nega suas qualidades, que são notáveis. É um livro que permite confrontar a prática, isto é, a guerra civil, com a teoria, expressa em obras anteriores de teor mais genérico. Só esse cotejo já é fonte de inúmeras indagações, presentes na bibliografia, como por exemplo no mestrado que tive o prazer de orientar de Eunice Ostrensky, a tradutora deste livro, e que entre outras coisas procura dar conta das aparentes – e por vezes reais – contradições entre o Behemoth e as obras teóricas [5]. Além disso, como Hobbes mal começa a ser trabalhado, uma vez que nos últimos vinte anos tivemos a seu respeito mais livros significativos do que em qualquer período de tempo comparável dos três séculos precedentes, os diálogos sobre a guerra civil constituem um excelente desafio para quem pretenda aprofundar-se no filósofo.

Apenas um ponto, dessas diferenças, eu gostaria de apontar antes de passar a palavra ao autor: é que, enquanto o Leviatã aceita e acata o poder, que parece consolidado, de Cromwell, o Behemoth dá a entender que, se a República não se manteve na Inglaterra, isso se deveria ao fato de nunca se ter consolidado (porque nunca poderia consolidar-se) o Estado cromwelliano. Talvez seja essa a principal, ou pelo menos a mais visível, diferença entre as duas obras. Com efeito, o Leviatã até usa, para designar o Estado, o termo que Cromwell empregou para o seu regime, “Commonwealth” – literalmente “bem comum”, ou “coisa pública”, isto é, República. Esse termo na época possuía dois sentidos principais, um ampliado – toda e qualquer forma de governo, mesmo monárquica, enquanto visasse ao bem comum –, outro mais restrito – aquela forma de governo na qual os dirigentes são eleitos. É óbvio que Cromwell e os holandeses destacam o segundo sentido, e Hobbes, o primeiro. Mas são evidentes as conotações, quase pró-cromwellianas, da escolha terminológica de Hobbes.

Mais que isso: nosso autor publica o Leviatã ainda exilado no continente, e logo, percebendo que assim suscitara o ódio dos monarquistas que lá se haviam refugiado, volta à Inglaterra e se submete ao novo governo. E é claro que a ira monárquica contra ele se deve principalmente a duas passagens, uma no cap. XXI, outra na “Revisão e Conclusão” (e que será suprimida na tradução latina posterior à restauração da monarquia), em que justifica um poder alcançado mediante a conquista e que tenha consolidado sua regra, assegurando a ordem entre os súditos. Há lógica nisso: se o poder se explica, não como dádiva divina, mas como construção para preservar a vida dos cidadãos, sua prova dos nove está no modo como atenda a essa finalidade tão terrena, e não na obediência a um misterioso mandado de Deus. E essa idéia-chave, que vem do contratualismo, Hobbes não pode mudar nem jamais mudará: se o fizesse, deixaria de ser Hobbes.

Contudo, o fato é que, após a morte de Cromwell, seu poder se esboroa. Os Stuarts voltam ao trono. Tudo indica que Hobbes tenha gostado do desfecho, embora provavelmente tenha temido, no curso do processo, a desordem (e aí, sim, os radicais tentaram desempenhar um papel que nosso filósofo não apreciava em absoluto!). Hobbes precisa dar conta do seu erro de previsão, por assim dizer. E ele o faz alterando o menos que pode sua convicção anterior. Em outras palavras, não abre mão da idéia de que o governante deve seu poder a interesses e vontades muito humanos. Embora insinue, vez por outra, uma saudação ao direito divino ou à legitimidade dinástica, seu problema continua sendo a paz. Isto é, em última análise, muda sua leitura de Cromwell: não é que ele fosse um usurpador, e por conseguinte ilegítimo. O problema crucial e principal é que ele não conseguiu consolidar seu poder. A impressão, válida em 1649 ou 1651, de que a República iria perdurar foi desmentida pelos fatos. E é possível que, se não conseguiu consolidar-se, fosse mesmo porque é muito difícil um poder novo adquirir a mesma qualidade daquele que tem, em seu favor, a longa duração no tempo. Continua, pois, valendo o poder por sua finalidade neste mundo – trazer-nos a paz – e não sua suposta e legitimista meta no outro mundo: proporcionar-nos a salvação eterna. Somente, um Estado novo parece menos apto a trazer a paz do que aquele que já tem a opinião de todos em favor de seus direitos e costumes. O que significa, para concluir, que aqui Hobbes parece dar uma resposta a Maquiavel, cujo Príncipe, em última análise, trata sobretudo disso: como pode um príncipe novo, que tenha conseguido o poder pelas armas alheias, e portanto não conta em seu favor nem com exércitos próprios, nem com a opinião reiterada ao longo das gerações, conseguir criar uma tal opinião, uma tal obediência? O que Hobbes poderia responder é que tal resultado é muito difícil – e mesmo quando o novo governante, no caso de Cromwell, conta com um ótimo exército. A opinião não muda tão facilmente. Ou, por outra: é relativamente fácil subverter um governo, os presbiterianos que o digam. Mas substituí-lo por um novo é muito difícil: que o digam Cromwell – ou os mesmos presbiterianos.

Sete Praias, outubro de 1999.



[1] Sobre a terceira causa de guerra, ver, no Leviatã, o cap. XIII. Ver também a capa da edição original de 1651, sistematicamente reproduzida – provavelmente a imagem mais conhecida da filosofia política, e que aparece em inúmeros livros de ciência política -, na qual, sobre o rei que empunha espada e báculo, aparece a referência ao livro de Jó , que celebra o Leviatã como um poder ao qual nenhum se compara, neste mundo (cap. 41, versículo 25). A respeito da honra ou glória como causa de guerra, e de sua importância, ver THOMAS, Keith, “The social origins of Hobbes’s political thought”, in BROWN, K. (org), Hobbes Studies, Oxford, Blackwell, 1965e RIBEIRO, Renato Janine, Ao leitor sem medo – Hobbes escrevendo contra o seu tempo, Belo Horizonte, Editora UFMG, 1999. Finalmente, a explicação do título do Leviatã pode ler-se em MANENT, Pierre, Naissances de la politique moderne.

[2] Enquanto o Leviatã é um dragão ou serpente, o Behemoth é na Bíblia um hipopótamo. Ver Jó, cap. 40, vv. 15-24. É importante notar que o texto bíblico não fornece elementos suficientes para valorar positivamente um dos monstros (no caso, o Leviatã hobbesiano, que é o poder de Estado, pacificador) e negativamente o outro (o Behemoth de Hobbes, que é a guerra civil).

[3] Pessoa é um conceito jurídico, que não se refere necessariamente a um indivíduo. No caso de Hobbes, pode ser uma assembléia – e nesse caso o Estado será democrático ou aristocrático, não monárquico. Lembremos que as pessoas são com freqüência fictae, fictícias.

[4] A Marca do Leviatã, cap. II. No cap. IV desse livro, trato, em especial, da revolução em Hobbes.

[5] OSTRENSKY, Eunice. A obra política de Hobbes na Revolução Inglesa de 1640. São Paulo, mestrado defendido em 1997, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.